Além da proteção social do aposentado e o sustento de sua família, a Previdência Social garante a movimentação econômica e o incremento do PIB dos municípios, sobretudo dos pequenos, sustentando o consumo, gerando emprego e renda.
Aliadas à crise econômica, que jogou 13 milhões de brasileiros no desemprego e derrubou a arrecadação dos municípios, a proposta de reforma da Previdência e a nova lei Trabalhista, que legalizou o bico e as condições precárias de contratação, vão jogar milhões de brasileiros na linha da pobreza e levar à falência pequenos municípios.
A maior fonte de renda de 70% (3.875) dos 5.566 municípios brasileiros são os benefícios pagos pela Previdência Social, que superam, inclusive, os repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), uma espécie de mesada transferida pelo Executivo, como previsto na Constituição. Em muitos casos, o valor dos benefícios previdenciários recebidos pelos aposentados supera até mesmo a Arrecadação total do município, como ocorreu em 2010, quando 82,4% das cidades tiveram Arrecadação inferior ao valor das aposentadorias pagas pelo INSS.
Os dados fazem parte do livro A Previdência Social e a Economia dos Municípios, de 2010. Segundo o autor, Álvaro Solón de França, atualmente, a tendência é a mesma, com um agravante: “hoje, é ainda maior a dependência dos pequenos municípios em relação aos benefícios previdenciários devido a queda da arrecadação por parte do Estado e ao aumento do desemprego”.
Álvaro Solón, que também é ex-presidente do Conselho Executivo e do Conselho Curador de Estudos da Seguridade Social da Anfip, diz que essa tendência se explica porque os tributos em que o FPM se baseia – 23,5% da arrecadação do Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) – caíram devido à queda de arrecadação e à política recessiva do atual governo ilegítimo de Michel Temer (PMDB-SP).
“Estão fazendo um ajuste fiscal brutal em cima das camadas mais pobres da população brasileira, então é natural o impacto disso nos municípios e o aumento da dependência em relação aos benefícios previdenciários. Isso já está sinalizado no estudo que estamos atualizando”, explica.
Para Álvaro, se a nova proposta de reforma da Previdência for aprovada pelo Congresso Nacional, a situação econômica debilitada dos pequenos municípios se agravará. “Mexer dessa forma na Previdência, ainda mais depois da reforma Trabalhista, que criou um mercado de trabalho intermitente, sem direitos e sem acesso ao sistema previdenciário, é jogar novamente milhões de brasileiros abaixo da linha da pobreza”, alerta.
“Sem os benefícios previdenciários, haveria mais 23 milhões de brasileiros vivendo na miséria”, afirma Álvaro, ao destacar, sobretudo, as políticas públicas do período de junho de 2003 a dezembro de 2010, no governo do presidente Lula, quando a pobreza foi reduzida em 50,6%. Álvaro se referiu aos benefícios pagos pelo INSS, aos aumentos reais do salário mínimo e à expansão das políticas de transferência de renda.
“A cobertura quase integral dos idosos por meio da Previdência com o piso atrelado ao salário mínimo valorizado se tornou um seguro contra a pobreza e a miséria, tanto para o aposentado quanto para a sua família”, completa, ao destacar que tem cidades em que a economia se baseia na data do recebimento da aposentadoria.
O município de Macururé, na Bahia, é um importante exemplo do impacto que pode acarretar a reforma da Previdência na economia das pequenas cidades. Nesse município, segundo estudo citado no livro “A Previdência Social e a Economia dos Municípios”, 79,2% da população possuem renda inferior a três salários mínimos e, desse total, 36,5% correspondem a benefícios previdenciários, superando até mesmo a renda do emprego público, que representa 24,2% do total.
Para o presidente da CUT, Vagner Freitas, o fato de a maioria dos municípios brasileiros dependerem da renda que vem das aposentadorias e esse valor superar o repasse do FPM e da Arrecadação apenas confirma a importância da Previdência Social como promotora de cidadania e justiça social.
“O Brasil não precisa de uma reforma que acaba com a aposentadoria, precisa de crescimento econômico com distribuição de renda, ampliação do crédito, dinamismo às economias locais”, defende Vagner, que completa: “quem faz ajuste fiscal nas costas da classe trabalhadora e propõe renúncias fiscais bilionárias a setores privilegiados, como a isenção de R$ 1 trilhão às petrolíferas estrangeiras, não está preocupado com o Brasil, está preocupado apenas com o poder.”
A pesquisadora do Cesit/Unicamp, Marilane Teixeira, concorda com o presidente da CUT e destaca que a reforma da Previdência terá um impacto maior nas famílias mais pobres, em que a aposentadoria se tornou a principal fonte de renda.
Para ela, se a reforma passar, além de restringir o acesso de milhões de brasileiros e brasileiras à Previdência, os comércios locais das pequenas cidades não vão conseguir se dinamizar e, como consequência, diversos empreendimentos vão sumir. “Isso vai empurrar as pessoas para o trabalho informal e precário, além das consequências como o êxodo rural”, alerta Marilane, lembrando que a maioria dos benefícios previdenciários (68,3%) é de até um salário mínimo e que esses recursos são injetados diretamente na economia local.
Previdência rural
Com a nova proposta de desmonte da Previdência, a aposentadoria dos assalariados rurais e agricultores familiares corre o rico de acabar, o que terá um impacto brutal na economia dos municípios mais pobres.
É o que explica a vice-presidenta da CUT, Carmen Foro. “Se não fosse a aposentadoria, principalmente no meio rural nos pequenos municípios, já teria se instalado uma situação de miséria e caos em diversas cidades brasileiras”.
Ela explica que a nova proposta iguala as regras dos trabalhadores e trabalhadoras assalariadas rurais aos urbanos e ainda exige dos agricultores familiares uma contribuição mensal e individual, o que pode significar o fim da aposentadoria rural.
“Nós temos condições de alimentar o país e queremos estar dentro da Previdência Social numa perspectiva da função econômica e social desempenhada pelo trabalho rural e não na condição de miseráveis”, afirma Carmen, em referência ao fato de os agricultores familiares responderem por cerca de 70% dos alimentos consumidos no país.
Segundo a pesquisadora da Unicamp, Marilane Teixeira, o campo já sente os impactos do desmonte do Estado brasileiro promovido pelo golpista Temer. Ela alerta para o risco de os trabalhadores rurais migrarem para a cidade por falta de políticas públicas.
“O governo desestruturou a maior parte dos programas junto à agricultura familiar, à política de reforma agrária e as consequências começam a aparecer, como o êxodo rural e o aumento da violência no campo”, destaca.
Para a vice-presidenta da CUT, se tiver políticas públicas para o campo, as pessoas melhoram de vida e conseguem assim pagar a Previdência. “Mas, como os rurais vão conseguir pagar se não têm mais crédito e nem um conjunto de políticas públicas?”, questiona Carmen, que completa: “esse é o grande desafio para o Brasil”.
A solução, diz a vice-presidenta da CUT, é manter a Previdência dos rurais do jeito que está, e não fazer o campo voltar para o mapa da fome e quebrar a economia de pequenos municípios.
Fonte: CUT