A recente minirreforma administrativa promovida pela Prefeitura de Beberibe (CE) tem sido alvo de intensas críticas e levantado preocupações quanto aos impactos sobre os direitos dos servidores públicos municipais. As mudanças, que envolvem extinção de cargos, reestruturação de carreiras e alterações em planos de cargos e salários, vêm sendo analisadas sob a ótica jurídica, com especialistas apontando possíveis violações a direitos trabalhistas e constitucionais.
Um dos principais pontos de controvérsia é a extinção de cargos vagos na administração direta, medida que afeta diretamente candidatos aprovados em concursos anteriores e a expectativa de ingresso no serviço público por meio de novos certames. A exclusão dessas vagas elimina oportunidades futuras e pode comprometer a continuidade de serviços essenciais à população.
As alterações no Plano de Cargos, Carreiras e Remuneração (PCCR) da Administração, instituído pela Lei nº 583/2000, também chamam atenção. No nível superior, o número de categorias profissionais caiu de 28 para 10; já nos níveis médio e fundamental, a redução foi de 29 para 16. A diminuição expressiva levanta dúvidas sobre a legalidade das mudanças, especialmente quanto à progressão funcional e à estabilidade dos servidores. Juristas alertam que reformas estruturais dessa natureza exigem instrumentos legais específicos e detalhados para assegurar conformidade com a Constituição.
Na área da Educação, as alterações foram igualmente profundas. A modificação do PCCR da categoria, estabelecido pela Lei nº 1.027/2010, impôs limites ao número de vagas por cargo, afetando diretamente a carreira docente. Especialistas destacam que, ao restringir vagas, a medida pode inviabilizar concursos públicos e provocar sobrecarga de trabalho para os professores em exercício.
Outro ponto crítico diz respeito às categorias dos motoristas e secretários escolares. A reforma alterou o plano de remuneração definido pela Lei nº 1.550/2025, aumentando de 12 para 50 os níveis salariais. Na prática, isso pode retardar o avanço na carreira e criar desigualdades internas, além de reduzir a previsibilidade na evolução profissional.
As agentes de alimentação escolar (merendeiras) e os auxiliares pedagógicos também foram atingidos. A categoria sofreu redução de nível na estrutura de carreira e diminuição no número de vagas, enquanto os cargos de auxiliares pedagógicos foram simplesmente extintos. As decisões são vistas como retrocessos e podem ferir princípios constitucionais como o da isonomia e da valorização do servidor público.
No setor de trânsito, a nova Lei Complementar nº 068/2025 gerou reações ambíguas. Embora tenha elevado as referências remuneratórias para os agentes de trânsito, reduziu o salário inicial da categoria para R$ 1.557,56, abaixo do valor previsto na tabela salarial anterior, de 2017. Advogados especializados apontam a possibilidade de ações judiciais por violação a direitos adquiridos e retrocesso remuneratório.
A série de mudanças foi duramente criticada pelo presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Beberibe, Franciedson Oliveira, que expressou indignação com o que classifica como desmonte das carreiras públicas.
“É um ataque direto à dignidade do servidor público de Beberibe. A Prefeitura está desmontando as estruturas de valorização dos trabalhadores sem qualquer diálogo com a categoria. Reduzem cargos, congelam progressões e jogam no lixo o esforço de quem dedicou anos ao serviço público. Não vamos aceitar retrocessos!”, declarou.
Do ponto de vista fiscal, a Prefeitura argumenta que a reforma contribuiu para a redução das despesas com pessoal, agora fixadas em torno de 44% da Receita Corrente Líquida (RCL), dentro dos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal. Com isso, haveria margem para realização de novos concursos, mas a recomendação jurídica é de que o município amplie o número de vagas previstas e a carga horária docente, além de estabelecer uma mesa permanente de negociação com sindicatos e representantes das categorias.
Apesar do argumento da gestão municipal de que a reestruturação busca equilíbrio fiscal, a falta de diálogo com os servidores e a ausência de estudos técnicos aprofundados sobre os impactos podem comprometer a legalidade e a eficácia das medidas. Juristas alertam que, sem revisões, a minirreforma de Beberibe poderá se tornar alvo de contestações judiciais e gerar instabilidade no serviço público local.