1,5 milhão de trabalhadores deixaram sindicatos de 2017 a 2018. E agora, o que fazer?

De 2017 a 2018, os sindicatos brasileiros perderam 1,5 milhão de filiados. É isso mesmo. 1,5 milhão a menos em 1 ano. Temos como marco deste período, a reforma trabalhista, que passou a vigorar em 11 de novembro de 2017 e que promoveu um desmonte da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), mas ela não explica sozinha esta realidade.

Os dados são da Pnad Contínua, divulgada pelo IBGE em dezembro de 2019. Conforme a pesquisa, a taxa de associação a essas entidades também caiu na proporção com o número de trabalhadores ocupados, atingindo 12,5%. Trata-se do menor patamar registrado pela pesquisa, iniciada em 2012.

De acordo com João Guilherme Vargas Netto, que presta consultoria para o movimento sindical, “nada disso é surpresa”, garante. João diz que, “esse resultado está aquém da realidade” e que “a grande queda na sindicalização ocorreu mesmo em 2019, e a Pnad só foi até 2018. A taxa real de trabalhadores associados a sindicatos, hoje, deve estar em 10% — ou até menos”.

Dos 92,3 milhões de brasileiros ocupados em 2018, apenas 11,5 milhões declararam ter alguma ligação com entidades sindicais. O número segue tendência de queda desde 2016, quando a quantidade de associados foi de 13,5 milhão, equivalente a 14,8% de todos os ocupados naquele ano.

Em seis anos, as entidades perderam mais de 2,9 milhões de trabalhadores sindicalizados. A recuperação da população ocupada, com acréscimo de 1,4%, em 2018, não foi acompanhada de expansão da população sindicalizada.

Segundo a analisa do IBGE, Adriana Beringuy, a queda na sindicalização está associada ao aumento da informalidade no mercado brasileiro e à já citada destruição de direitos trabalhistas.

“Temos cada vez menos trabalhadores com esse tipo de vínculo (carteira assinada) e os conta própria têm ganhado espaço nessa distribuição. Como são eles que crescem na ocupação, e possuem uma taxa menor de contribuição, no cômputo geral, (o sindicalismo) acaba tendo uma tendência de queda”, explica Beringuy.

Em 2018, o número de  pessoas ocupadas na informalidade chegou a 35,4 milhões de pessoas, em média  — outro recorde da pesquisa Pnad Contínua. Esse número engloba os trabalhadores no setor privado (11,2 milhões) e empregados domésticos sem carteira de trabalho assinada (4,4 milhões), além de empregadores (905 mil) e trabalhadores por conta própria sem CNPJ (18,8 milhões).

A conjura é ruim, mas as lideranças sindicais também são responsáveis

Desde os governos ultraliberais de Michel Temer e Jair Bolsonaro a situação se complicou para os trabalhadores que dependem dos Sistema de Proteção ao Trabalho – Ministério do Trabalho (extinto), Ministério Público do Trabalho (sob ataque), Justiça do Trabalho (ameaçada de extinção) e CLT (depenada) – e isso impactou no movimento sindical, seja por ação ou omissão.

As negociações entre capital e trabalho também se tornam mais duras, diminuindo a margem para reajustes reais e conquista de direitos. Em tempos de defensiva e resistência, uma das prioridades do movimento sindical passa a ser a não aplicação da Reforma Trabalhista e de outros retrocessos nas convenções e nos acordos coletivos. “Esse ambiente de crise, desemprego e dificuldades pode criar certo desalento em alguns setores, afastando trabalhadores do sindicato”, opina Nivaldo Santana, secretário nacional de Movimento Sindical do PCdoB e secretário de Relações Internacionais da CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil).

Milton Pomar, profissional de marketing e assessor sindical, analisa a postura das próprias lideranças do movimento. Nos últimos 4 anos, ele ministrou cursos para mais de 3 mil sindicalistas e assessores, em todo o País. Na maioria dos casos, não constatou disposição para “fazer acontecer”.

“Os dirigentes não vão aos locais de trabalho para filiar. Hoje, há uma cultura dominante de não arregaçar as mangas, de não ir às bases para argumentar”, afirma. “Há sindicatos que se limitam a divulgar um cartazinho, um banner, e chamam isso de ‘campanha’. Querem aumentar a receita, mas, de preferência, sem aumentar a quantidade de sindicalizados. Mais sindicalizados significa mais trabalho e despesas.”

Ele também alerta para a desproporção entre trabalhadores aposentados e ativos, sobretudo entre servidores públicos. “Os aposentados chegam a representar de 60% a 65% em algumas categorias do funcionalismo. Como tocar as lutas do pessoal da ativa se os sindicatos são sustentados por até 2/3 de filiados aposentados?”.

“O movimento sindical esqueceu que tinha de buscar mais associados e ganhá-los. Ficamos distantes da base. As campanhas contra o sindicato ficaram mais fortes, e nós perdemos a guerra da comunicação”, critica Miguel Torres, presidente do Sindicado dos Metalúrgicos de São Paulo e Mogi das Cruzes e da Força Sindical.

O que fazer para devolver os trabalhadores aos sindicatos?

Fundamentalmente, é necessária uma revisão da perspectiva do sindicalismo sobre os trabalhadores. Os novos tempos requerem novas táticas.

Alguns destaques das propostas de especialistas, são:

  • Atrair jovens e mulheres;
  • Aproximação com outros movimentos — como os sociais, culturais e esportivos;
  • Sensibilizar os trabalhadores desconectados do mundo sindical;
  • Atuar junto aos mais precarizados, com políticas para estes grupos (trabalhadores de plataformas, terceirizados, temporários, informais);
  • Formação (para além dos cursos enfadonhos e das velhas análises de conjuntura);
  • Profissionalizar a comunicação é outro imperativo – sem abrir mão dos meios tradicionais — como jornais e boletins — vale “explorar todo o potencial das mídias sociais”;
  • Aproximar mais as diretorias das entidades às suas bases;
  • Realizar campanhas permanentes de sindicalização, ressindicalização e fidelização;
  • Realizar pesquisa para compreender melhor o novo perfil da classe trabalhadora;
  • Desenvolver a luta política;
  • Desenvolver atividades culturais — como teatro, coral, saraus, mostras, feiras e outras.

“É preciso paciência, ousadia e perseverança”, diz Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos). “Paciência para resistir ao desemprego, às mudanças nas ocupações e no mundo do trabalho. Ousadia para inventar formas de organização de base no local de trabalho e no local de moradia, criar novas formas de mobilização e reestruturar os sindicatos para a nova dinâmica do mundo do trabalho. Perseverança no trabalho contínuo de base, em criar conexões para desenvolver a solidariedade. A adesão dos trabalhadores ao sindicato será o resultado convergente dessas frentes”.

Com informações do Jornal O Globo e do Portal Vermelho


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