Apesar do discurso de que a nova proposta de Reforma Administrativa não repetirá os erros da PEC 32/2020, os sinais vindos do Grupo de Trabalho (GT) da Câmara dos Deputados acendem o alerta entre parlamentares e entidades do funcionalismo. Na última quarta-feira (9), o relator do GT, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), antecipou alguns pontos do anteprojeto que deve ser apresentado nos próximos dias, sugerindo que uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) será inevitável — mesmo após afirmar, no início dos trabalhos, que buscaria evitar mudanças constitucionais.
A justificativa, segundo Pedro Paulo, seria a necessidade de dar “robustez e profundidade” à proposta e assegurar comandos constitucionais para temas como concurso público nacional unificado, revisão do estágio probatório e regulamentação dos chamados supersalários. No entanto, o relator tenta minimizar os temores de que a proposta reedite os ataques aos direitos dos servidores públicos contidos na PEC 32, embora reconheça que a minuta será entregue às vésperas do recesso parlamentar, sem tempo hábil para debate amplo com a sociedade.
Durante a última audiência pública do GT, parlamentares de diversos partidos progressistas manifestaram preocupação com a possibilidade de que a proposta se transforme, mais uma vez, num mecanismo de ajuste fiscal às custas do funcionalismo. “Há uma preocupação gigante sobre os resultados do grupo de trabalho”, alertou a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), que criticou o processo pouco transparente e o risco de se repetir o modelo de reformas que penalizam servidores e precarizam os serviços públicos.
A deputada Luciene Cavalcante (Psol-SP), assim como os deputados André Figueiredo (PDT-CE), Ana Pimentel (PT-MG) e Sâmia Bomfim (Psol-SP), reforçou que a estabilidade do servidor, a qualidade do serviço público e a valorização da carreira devem ser inegociáveis. Eles lembram que, em 2021, a PEC 32 gerou forte mobilização social e sindical justamente por atacar esses pilares — e veem com ceticismo as garantias oferecidas por Pedro Paulo.
Na tentativa de aliviar a tensão, o relator afirmou que “não será utilizada uma vírgula nem um artigo da PEC 32” e que não haverá mudanças na estabilidade, no tamanho do Estado ou tentativa de ajuste fiscal. Ainda assim, não convenceu: a falta de clareza e o histórico recente da Câmara em propor reformas regressivas deixam o funcionalismo em estado de alerta.
Governo já implementa mudanças, mas sob outra perspectiva
Enquanto isso, a ministra da Gestão e da Inovação, Esther Dweck, pontuou que a reforma administrativa no Executivo federal já está em curso, mas com outro enfoque: reconstruir a capacidade do Estado brasileiro após anos de desmonte. Segundo ela, o governo Lula já implementou 38 medidas administrativas que buscam modernizar e valorizar o serviço público, como a Lei Geral dos Concursos, a nova Lei de Cotas e a vinculação da progressão funcional ao desempenho, conforme a recém-aprovada Lei 15.141/25.
Dweck sinalizou ainda que o Executivo deve propor em breve novas reformas, incluindo a regulação do direito de greve e a negociação coletiva dos servidores, com base na Convenção 151 da OIT — demandas históricas do funcionalismo.
Ainda que o governo federal esteja avançando em uma agenda de reconstrução e fortalecimento do setor público, o movimento na Câmara reacende preocupações com a possibilidade de uma reforma administrativa que, mais uma vez, repita a lógica de desmonte, ataque à estabilidade e redução de direitos, sem considerar o impacto direto na vida da população que depende dos serviços públicos.
Diante do histórico recente, fica o alerta: é preciso vigilância constante e mobilização para que qualquer proposta de reforma administrativa seja, de fato, construída com diálogo, transparência e respeito aos trabalhadores do setor público — e não mais um instrumento de austeridade disfarçada.